segunda-feira, 26 de setembro de 2016

eu sou uma multiplicidade de coisas
que não cabe em ser medida
sou a perda, me perca
me veja partir e me ignore
passe por mim como se eu nem existisse
pois eu nunca vou deixar de estar aí
e nem de ser, muito menos de sentir
eu sou pluralidade, sou complexidade as avessas
sou caos e sou ritmo cego e certeiro na ausência de minhas direções

vario em minhas próprias variações
sistema de compreensão complexa
já disse que sou complexidade
e me encanto por ela
me encanto pela complexidade que vejo em ti
e também pela complexidade de todas as outras coisas
a simples complexidade  que nos permite conceber nossa própria existência

não sei pronde fui
nem sei donde vim
mas sei que comigo eu carrego uma imensidão profunda
um tesouro escondido
uma riqueza soterrada
no fim, acho que sou mesmo um mineiro
escavo em mim os mais profundos poços de petróleo
e neles cesso a minha sede
me alimentando do mais profundo do meu ser

e me perdendo na infinidade de tudo
1
come a porta
com seus dentes tortos
retorcendo a maçaneta
enquanto a língua sangra

2
blues
na sala
sol na janela
e a fumaça sobe
dos seus olhos em chamas

3
são as mesmas respostas
as mesmas vontades
os mesmos abismos e seus saltos
o abissal do insensato
nas palavras prediletas

do sujeito profeta

quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Na cidade pequena os gatos fazem muito barulho de madrugada
Os cachorros dormem no meio da pista, donos do espaço
Carros são perseguidos por cães gentis
E muito se briga pelo pouco que resta dessa paz não humana
Mas afinal, o que querem os homens num lugar como esse?

E afinar tudo é passar por um lugar que eu nem bem conhecia
Qual o espaço e a métrica de se ter um lugar dentro de uma sinfonia desconhecida
Tocar as cegas a compreensão do novo
É plenamente existir de fato
Com uma doze de juízo
E dúzias de inconsequências corajosas
Foda-se o pênalti
Mas será mesmo, cobrador?

Quem fecha as contas no fim das contas, hermano?

Mas que regras regem esse jogo, se não uma nova conduta prestes a ser decifrada
Entregar-se é também desvendar
E tu não andas sozinho
Cada memória é um caminho
E força é certeza
Na completa impossibilidade de previsão de qualquer coisa
E eu não faço a mínima ideia do que possa acontecer

Eu sou um agente
Eu sou um, a gente?
A gente faz o brega ficar chique
E cava fundo na percepção
Conhecer, desvendar/interpretar, crer ou não crer (eis a questão?), proceder, se responsabilizar por uma escolha.
Escolha
É preciso ter um lado
Ou não?
Somos todos juntos
Mesmo?
Não é um questionário, são questões
Quem, compreende o que?

Eu não entendi
Então quem foi?

A difícil resposta se encontra na perda
No perder-se
Pra ser, mais exato
Mesmo que completamente aleatório

Cachorros latem
Gatos brigam
Na cidade pequena
Poucos ouvem
Muitos gritam

Talvez fosse a hora de reler todo o texto. Buscar uma interpretação de tudo o que já foi dito.

Com base no autor

É quase um segundo capítulo
Pode ser um fim
Ou recomeço
Uma etapa num desenvolvimento mais complexo
Milhares de coisas, inclusive, nada
Ou
Uma salvação

Aposta?

A troco de que se troca uma vida dessas?
Afinal, o que é viver?
Pra você, o que é viver?
E a troco de que?

Quanto se paga pelo luxo do desfrute de uma vida?

Vale aceitar sentir o que se sente e enfrentar sem medo qualquer incerteza
Pois tudo é incerteza.
Tudo se relaciona com tudo
Infinitos vezes infinitos
No plural de infinidades
Qual é a resposta?
42?


Os cachorros latem

Sempre adorei ler Álvaro de Campos
E suas vantagens de ser invisível no canto da janela
Quando só resta apenas uma casa com a lamparina acessa


Quem mora nela?

terça-feira, 20 de setembro de 2016

Quando eu penso demais no significado das palavras, elas simplesmente não saem. Quando eu penso demais na interpretação que as pessoas vão fazer do que eu escrevo, eu simplesmente não escrevo. A verdade é que a minha limitação com as letras faz com que eu me ache eternamente repetitivo. Eu sempre falo as mesmas coisas, do mesmo jeito. Inclusive falar sobre isso e dessa forma não é nenhuma novidade pra mim.

Eu sofri uma queimadura e agora eu tenho uma bolha no meu polegar opositor direito. Ao mesmo tempo eu estou com uma enorme espinha no canto da boca. Essas duas anomalias físicas tem ocupado grande parte do meu tempo ocioso. Paro em frente ao espelho e analiso a espinha, com ela vejo minha barba farta e todos os pelos brancos, ruivos e negros que habitam o meu rosto cansado e quase irreconhecível. As marcas nos cantos dos olhos cada vez mais profundas, as olheiras pesadas de um cotidiano de trabalho excessivo, nada disso me incomoda enquanto eu ainda conseguir ver um pouco de beleza no fundo dos meus olhos.

Aperto a bolha no dedão, não sei que tipo de líquido é esse que a preenche, mas não quero que ela estoure. A queimadura não doeu o tanto que a marca dela faz parecer que ela deveria ter doído. Eu não sei muito sobre a minha resistência á dor, afinal de contas eu não sei quanta dor um ser humano é capaz de sentir. Não consigo me recordar qual tenha sido a minha experiência mais profunda com a dor física. Talvez quando eu rompi o ligamento do joelho ou algum chute no saco. Meu cotovelo quebrado, minha tatuagem na costela, foram dores sim, mas totalmente suportáveis. A dor que mais me doeu até hoje não foi física, isso é fato. Mas sobre isso eu não converso mais.

Gosto de pensar que eu sou uma pessoa com uma boa imaginação. Volta e meia construo situações na minha cabeça e me enfio nelas com toda a minha verdade. Já chorei pensando em coisas ruins, já chorei pensando no meu time campeão, já sorri feito besta andando sozinho na rua, já tive que tomar remédios pra ansiedade por não conseguir me desligar de ficar imaginando possibilidades infinitas a respeito de coisas as quais eu não possuía o menor controle.

Nos meus momentos mais difíceis eu habitualmente penso em uma mesma situação. A sensação de enfiar lentamente uma faca no meu peito. E não é qualquer faca, é uma faca específica que eu tenho em minha casa. E eu fico sentado na entrada da cozinha, do lado do armário, sem camisa e aos poucos, bem aos poucos vou sentindo a faca, meu peito, a faca, o frio, a faca, meu peito, a faca, espetando, a faca, meu peito, o frio, a parede, a faca, minha filha, eu paro. Faço um corte no lado de fora do antebraço esquerdo e levanto. Só dói depois que eu chego no corredor e eu me obrigo a deixar doer. Depois vem toda a lógica de como eu vou explicar isso pras pessoas. Penso na preocupação da minha mãe, minha família querendo que eu me trate e coisa e tal. Depois a paranoia com a perda de sangue e se eu devo ou não ir a um hospital levar pontos. Claro que eu ignoro a sujeira no chão e tudo mais. São alguns limites que eu acabo encontrando, e graças a eles eu acho que consigo discernir o que é real do que não é.

Com as palavras a sensação é um pouco a mesma. Os limites que elas me impõem enquanto eu tento trazer pra fora de mim tudo isso que eu sinto, são mais um degrau nessa construção de mundo que eu impensadamente faço desde que me entendo por gente. Quando eu era mais novo me lembro de desejar uma máquina capaz de traduzir todos os meus pensamentos e torna-los reais em segundos. Uma obra de arte, um filme, um personagem, uma foto. O que quer que eu viesse a pensar se tornaria real e completo em segundos. Me lembro de achar que se isso fosse possível eu poderia mostrar o meu valor ao mundo. Uma vez depois de muito tempo, ouvi uma pessoa me dizer que tinha esse mesmo desejo. Só que quando eu ouvi isso, eu já sabia que isso já era possível e que ter que enfrentar todas as dificuldades de trazer por si só a sua imaginação para o mundo era o que fazia tudo ter valor.

Imagina só se todas as pessoas tivessem uma ferramenta capaz de tornar tangível todos os seus pensamentos. Haveria gênios e grandes lideres, claro. Mas também viveríamos soterrados por milhares de ideias rasas e regulares. E sempre que eu pensava na existência dessa máquina o meu maior medo era que mesmo com ela eu continuasse a ser só mais querendo ser alguém de fato. Foi a compreensão da necessidade do esforço criativo que me fez entender qual é o limite entre ser só mais um e ser alguém.

A verdade é que a satisfação com a criação deve ser apenas do próprio individuo e não algo atrelado á aprovação popular. A verdade é que é mesmo bem simples e idiota e é esse mesmo papo piegas de sempre de que é você e mais ninguém quem determina o seu estado de satisfação com a sua própria existência. As letras nunca me deixaram satisfeito. A fotografia se dispôs como uma alternativa e nela eu encontrei mais do que esperava.

Me lembro de negar a sua função no início. Me lembro de me sentir insatisfeito com a facilidade com a qual ela se apresentava. Qualquer um poderia fazer aquilo que eu estava fazendo, na verdade, muita gente estava fazendo a mesma coisa que eu e muito melhor do que eu. E ainda está. A diferença é que hoje eu entendo o meu caminho, hoje eu compreendo o meu processo e por isso eu sei que se eu me dedicar, eu vou ser capaz de alcançar o que eu desejo.
Pra além das letras e das imagens estáticas, ainda me restam os desejos audiovisuais unindo as duas esferas na criação de mundos como os que eu tenho na minha cabeça, as artes plásticas, o desenho e por fim o meu maior objetivo; a música.

Mas para toda e qualquer forma de me expressar, o que para mim é o mesmo que existir, eu sempre estarei preso a mim. Por isso eu busco a minha forma de fazer as coisas. Nem sempre isso é uma boa coisa, a limitação técnica é um grande empecilho e parte do esforço artístico está em se vencer essa barreira de dedicação e suor e aprender o jeito certo de fazer as coisas. As normas, as regras. Sempre me disseram, aprenda a forma correta e depois faça do seu jeito. Mas eu me acho especial demais pra dedicar tanto tempo assim as regras. Eu prefiro ir fazendo e com meus erros e acertos ir me afinando até que um dia eu chegue no ponto no qual eu vou me sentir satisfeito.


Quando eu penso demais nas regras, eu simplesmente não vivo. Um brinde á vida que brota de toda liberdade. Amém. 

sexta-feira, 16 de setembro de 2016

meus olhos
rompem a barreira
e nada sobra
tudo é vida
é vista, é visão é vislumbre
verossimilhança
versatilidade
verso
profecia, protesto

assino contratos com a incerteza
belezas infindáveis
sentidos incompreensivos
vaidades e vadiagens
conversas mal acabadas
e beijos não dados
toda a crueldade do abstrato

como telhas
como a água
como a última noite de uma criança
como a verdade de um pássaro cego
como a hora de uma lesma

esqueço a dor
mas me lembro
do amor
que eu não tenho
por você
eu deixo ser
qualquer coisa
mesmo que nem faça
diferença alguma
ser assim tão o mesmo de sempre
tão óbvio pra quem já sabe
mas engraçado
nem reconhecer
essa profundidade
tão previsível
na minha lista de materiais
pra mais um ano letivo

são dois em um
um por dois
são cento e dezoito
de novembro
de mil novecentos e lá vai conta
nada contra
é só o destino escarlate
que não me espanta jamais

e a resposta é sim
independente do que se pergunta
a imagem que eu nem reconheço de mim
mais um espelho
outro espectro
e eu nem lá estou
mas vejo
minhas mãos
sua boca
seus cabelos

nem sei onde começa
nem sei onde eu encontro
nem sempre
ou talvez
seja só meu jeito de querer te deixar crer
meu jeito de vencer

se deus é um delírio

então você pode ser a minha religião