domingo, 29 de agosto de 2010

algo que eu simplesmente não sei definir ou agora

Esse não é ele, pensou ela. Aquele ali, tão tanto e ao mesmo tempo tão sem intenção alguma. Aquele não era ele. Aquilo não era o que de verdade se escondia por debaixo de toda aquela casca gasta, pelo menos era isso que ela preferia pensar.

Enquanto o mundo seguia de acordo com a desordem do divino aleatório, enquanto os homens não conseguiam compreender a compreensão tão remota e simples da mera e absoluta incerteza, enquanto as palavras se agigantavam entre todas as respostas e questionamentos, enquanto isso...

Não começo o que eu termino. Não escapo do que eu corro. Não me entrego ao que eu desejo. Venha e saia, veja e diga, ouça e entenda.

Silêncio enquanto se espalha pelo chão aquilo que se julga ser o que de fato determinam que se diga é. Não sou. Exposta a ambição do contentamento coletivo, exposta a euforia de se expor, exposta a verdade que se coube mais conveniente ao momento. Sou eu esse, mas esse nem sempre sou eu.

Os versos ficam vermelhos enquanto as flores, cada vez mais amarelas se encantam pelo frio contato azul. Não deu pra entender, mas eu posso explicar. Eu posso qualquer coisa agora, tudo não passa de uma questão de diversas coisas. A forma mais ridícula de se dizer toda a verdade, a forma que todos usamos e que todos amamos condenar. Todos queimam pontes.

Ele queria mais do que tudo aquilo ao mesmo que tudo aquilo o bastava. O momento era feito de diversas euforias, diversas sensações que se misturavam criando a convicção de que se podia ser de fato convicto aquele ponto. Tudo podia dar certo em alguma das combinações infinitas que o destino propõe. O fato de ter essa certeza tornava as coisas leves e os sentimentos cada vez mais reais, explícitos e profundos. O mundo nem sempre entendia a forma com que ele devolvia o que do mundo ele sentia.

Passos lentos, pés descalços, descaso. Não havia nenhuma contenção, não havia nenhuma privação, não havia medo. Os olhos abertos a procura de qualquer beleza simples que a luz do dia pudesse apresentar no caminho de volta. O mecanismo era o mesmo, mas a percepção dava-se o luxo de ser livre.

Parece que ficou um pedaço pra trás. Parece que o retrocesso e o progresso resolveram seguir o mesmo caminho. Parece que retomar é a forma de poder ressurgir ainda maior do que antes. Mas nem sempre se devem aprovar todos os efeitos.

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

pedaços de nada

“A cortina balança ao sabor do vento. Eu digo palavras que não são minhas enquanto imito exageradamente alguém que nós dois conhecemos. Dou mais um trago no meu cigarro enquanto te vejo passeando as mãos pelo cabelo. Eu sempre te achei linda e você sabe disso, você sente isso.

Você ri distraída olhando pro teto enquanto busca uma palavra pra me tentar fazer entender seus motivos de não concordar com alguma conclusão qualquer que eu tirei naquele momento. Depois de você se espreguiçar um pouco eu te beijo e te olho nos olhos enquanto passo o dedo pelos seus lábios lentamente me deliciando em cada segundo que voa dentro de mais uma noite quente. ”

“Mais uma dose, enquanto eu enforco o violão entre meus braços, mais um trago pra que eu possa me perder pelo espaço. A luz da lua entra pela janela enquanto eu busco uma forma de entender o que é que me manteve ali até àquela hora.

Talvez seja o fato de que eu não quero ver mais ninguém. Talvez seja o fato de que eu não preciso de nada que as ruas possam me oferecer essa noite. Talvez seja o fato de que minha cama, tão vazia quanto meu coração, é sem duvida nenhuma o melhor lugar pra que eu possa afogar meus prantos e reencontrar minha paz. ”

“Desligo a tevê e tudo parece ser como ontem. A prisão em que me mantive faz com que eu já nem sinta mais as mudanças que o tempo causa. Sem fechar meus olhos me deito á procura de abrigo em algum outro plano onde eu seja capaz de ser maior do que aqui.

De um lado para o outro da cama monto e desmonto diversos destinos pro meu amanhã, sempre com a certeza de que ignoro a opção estável. Algo precisa ser movido, algo precisa ser trocado, algo tem que me tirar daqui. ”

“Você não entende. Eu nunca tive opção. Eu nunca pude fazer minha escolha. Sou como um daqueles coitados que a sociedade cria pra justificar seus próprios pecados. Sou como um daqueles meninos somalis mortos de fome que chocam a todos, mas que não incentivam ninguém a fazer nada. Sou como uma daquelas pessoas pra quem a vida parece ter dado tudo de mão beijada, mas que mesmo assim ainda prefere reclamar aquilo que não tem.”

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

pra sempre

Já não havia formas de negar-se a ceder. Tudo o que aos poucos o arrastou até á margem, tudo o que gota a gota o fez perder as forças. Todos os tropeços que antecederam a sua queda, a derrota havia se consumado e as pernas cansadas e ombros pesados daquele homem já não conseguiam mais compreender o motivo do cérebro nunca dizer chega.

Seus olhos já não escondiam mais aquele brilho e suas certezas agora eram tantas e tão desencorajadoras que nenhuma de suas habituais fugas o poderia fazer esquecer que era hora de terminar tudo aquilo. Por quanto tempo mais levar adiante um punhado de ambições infundadas e de amores baratos e fugazes? Por quanto tempo mais acreditar que o tempo um dia iria trazer as soluções? De que valia insistir se mesmo com toda persistência o fracasso era sempre a única constante?

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

assim será?

Acordei com o atraso nos olhos. É terça-feira e chove do lado de fora. Acordei sem nenhuma vontade de ir, mas com a obrigação de fazer. Acordei sem querer despertar o que enfim em mim adormeceu sereno. Sem querer me encurralar entre aquelas paredes de novo, sem querer permitir que o ócio confunda ainda mais a minha cabeça.

Aumento o volume pra tentar me desvencilhar do restante do mundo. Eu não vou partir antes de dar adeus a todos. Eu não vou sair antes de dizer sem nenhuma palavra o que eu gostaria de explicar ao seu coração. Eu não vou até que eu tenha toda certeza de que eu não posso afirmar nada sobre mim. Eu não vou descer até que eu entenda o que é que me faz ser assim. Eu não vou parar até que a sua boca consiga calar a dor que grita no meu coração. Aumento o volume pra tentar encontrar na musica a hora certa de retornar ao mundo real.

Sigo com o silêncio dos meus olhos, um zumbi adestrado a procura de um alimento de papel. Um zumbi iluminado pela inconsciência opcional, um zumbi procurando se tornar invisível entre todas as rodas que correm velozes pela avenida encharcada de ódio e descaso. Eu sigo, pois seguir é sempre a única opção que me resta.

Mais meio caminho até o inferno das horas lentas e das verdades mais baratas do mercado. Mais meio caminho até a forma mais simples e mais banal de ser produtivo. Mais meio caminho até o ponto em que eu me afundo dentro de todas as coisas que se acotovelam entre minhas costelas. Mais meio caminho até o desespero de ser refém de valores tão irrisórios quanto desnecessários. Mais meio caminho até que fique provado que não há suporte algum aos meus objetivos. Mais metade do caminho mais curto, mais rápido, mas nem por isso, menos doloroso.

Eu me divido na tentativa de conseguir um meio termo, eu me divido na tentativa de conseguir a tolerância, a paciência, a sabedoria de acreditar que aquilo de alguma forma me será positivo. Eu me divido enquanto tento esquecer os pedaços de mim que foram jogados fora por tantas vezes pelas mãos que eu mais amei e amo. Eu me divido enquanto as duvidas que eu causo ao mundo dilaceram a minha expectativa de solução e solidificam minha solidão á beira desse abismo. Eu me divido na tentativa de escapar mais rápido dessa nova prisão.

O meio da tarde acende um cigarro. O tempo necessário pra algum tipo de alimento e um pouco de paz cercada de angustia e esperança enquanto o telefone não toca. A sua voz não me salva de nenhum dos meus problemas, mas ainda assim ela consegue ser tudo o que eu quero ouvir nessa hora. A fumaça se espalha lenta enquanto eu enxergo os carros entre as poucas gotas que ainda sobraram pra cair do céu. Os sinais se revezam, as pessoas se espremem debaixo das marquises e eu fui o único que corri atrás de um pouco de ar pra preencher com a fumaça cinza de mais um dos meus primeiros cigarros.

O tempo se acelera na volta e a cabeça consegue ser ainda pior durante as duas ultimas horas. O anseio pra que o relógio atinja o momento da liberdade e a expectativa sobre o que e quando fazer a noite. Nenhum dos meus planos se consolida nesse inferno de piso verde. Nenhum dos meus sonhos se torna real enquanto eu sigo as normas de conduta, nada se acresce a mim, exceto meus próprios desejos incapazes de se transcreverem em realidade.

Eu sou uma imensa bola de neve que desaba engolindo tudo o que fica em seu caminho. Eu sou a primeira pedra incandescente de fogo que escapa da boca do vulcão em sua ira e glória. Eu sou a folha que cai no lago e gira de acordo aos desejos do vento. Eu sou a infinidade de capacidades que todo o caos pode gerar em sua desordem sublimemente brutal. Eu sou um escravo, aprisionado de todas as formas. A hora de partir se aproxima.

Na volta já não há mais chuva, já não há mais pressa. Eu tenho tempo de sobra nas duas horas que me restam até que eu possa enfim me distrair a procura de algum talento ou aprendizado através da minha persistência. Na volta eu já não quero mais que o tempo corra, mas ainda assim eu desejo que o telefone toque. Na volta eu aos poucos me esvazio de tudo aquilo que me consumiu nas poucas horas em que estive a serviço da sociedade, a serviço do seu senhor deus de papel e valor.

Eu sou apenas mais um. Esse foi apenas mais um. Outro, apenas outro daqueles que vem se repetindo. Será que deu pra entender?