quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

o menino

Me lembro de um garoto que um dia eu conheci. Um rapaz que não media as palavras, que não sentia medo, que não falava mentiras e errava. Como e quão belamente ele errava. Sonhava com um mundo repleto de intensidades e belezas, sonhava com sentidos a flor da pele, com o gosto de um amor honesto, a chama do calor de uma mulher, da mulher a quem ele pertenceria, a mulher que o fizesse ver a sua própria verdade; Me lembro de um garoto cheio de bons amigos, amigos que iam pelo mesmo caminho, uma família mais forte e sincera do que qualquer laço de sangue. Me lembro de um garoto perdido, vago, incapaz de se traduzir pro mundo, vivendo dentro da sua própria cabeça a sinfonia da vida, com tanto pra ser dito, mas sem forma de dizer. Me lembro de um garoto que costumava escrever, um garoto que costumava comer as letras, trocar as vírgulas, esquecer da acentuação. Me lembro de um garoto que acreditava que a única forma de vencer era a honestidade, a entrega, o amor. Hoje eu vou encontrar esse garoto, num quarto escuro, ouvindo uma boa musica, fumando alguns cigarros. Hoje eu vou dizer a esse garoto que ele é eterno! Que ele é raiz e folha, ele é semente e terra fértil. Ele é a faísca fundamental de uma explosão de silêncios e pássaros e chuva e dor e prazer! Ele é amor! Amor do começo ao fim, amor pelo começo, amor pelo fim, amor pelos meios e pelas beiradas. Ele é amor e ele nunca acaba.

Olha garoto, acredita na vida pois a vida acredita em você. Sabe menino, tem gente boa demais do seu lado pra te ajudar a ser feliz e o que você tem é raro, você é raro. Menino, não tenha medo das lágrimas, não tenha medo da dor, não tenha medo de se admitir. Você pode sangrar litros, beber rios, voar alto, tão alto. Quem sofre cresce rapaz. Não fuja, não minta, não negue. O mundo te guia em direção ao infinito.

Menino, crescer não vai te fazer menor.

Eu já não sei no que acreditar. As coisas falham, falham, falham. Eu me perco dentro de mim, eu me perco dentro da dor, eu me perco na angústia infinita da expectativa infundada. Eu sufoco a minha alma minuto após minuto enquanto a vida se arrasta e a morte se aproxima. As linhas se desenham no meu rosto, as linhas se desenham no meu rosto, as linhas se desenham no meu rosto. Eu não sou menino! Eu não sou moleque! Eu não sou o dono do tempo, nem o dono do mundo, nem o dono de mim. Eu sou só mais um! Mais um por ai a procura de um monte de mentiras que me disseram ser verdade, eu sou só mais um que repudia toda essa merda, só mais um que sangra pela terra. Que sangra pela falta, pela injustiça, pelo horror, mais um que sangra por perder a hora, por calar a ordem, por manter a pose, por mascarar o porre e a porra e o gosto de vida que me acumula entre os dentes. Sou só mais um a serviço do relógio humano, do calendário que dita quando devemos soltar fogos, do calendário que nos obriga a ter fé, a ter força, a sair por ai afim de encontrar alguma felicidade. Do maldito calendário que me afoga de fotografias brancas e alegres. Fotografias bêbadas, alegria explosiva, expulsiva, exclusiva. Pura fotografia da vida.

Dessa falsa naturalidade impositiva. Dessa falta de normalidade assistida. Eu quero meu tempo! Com meu sangue e as linhas que se desenham no meu rosto antes, durante e depois de cada lágrima! Eu quero viver o menino sem medo, com os olhos de fogo e ouvidos de vento.

Chega de querer fazer parte de fotografias nas quais eu não caibo. Chega de distribuir sorrisos forçados. Chega de relações frias, chega de expectativas irreais. Eu só quero tudo, de todas as formas. Isso é pedir demais?



Eu só quero saber que os pássaros cantam enquanto dois irmãos procuram entender o mundo através de seus sentidos, de seus sentimentos, de suas incertezas e escolhas. O caminho é a busca.

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