sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Ilusão programda - 4

Não me lembro quando ou nem onde, tudo o que sei é que ele estava lá, na minha frente, sentado em uma grande cadeira giratória do outro lado de uma mesa de vidro em uma sala de paredes cinza, onde além da mesa só havia uma estante repleta de livros e de poeira. A medida que minha mente recarrega os fatos eu pareço revive-los.

O velho de terno branco e poucos cabelos na cabeça. Tinha dentes podres e fumava um charuto. Batia as cinzas no chão e a fumaça tinha cheiro de canela, sua cara de poucos amigos atravessada por um sorriso irônico ainda me tira o sono em alguns momentos. Não sei ao certo quanto disso tudo é ou foi verdade, quanto mais eu penso nesse momento mais coisas eu lembro e assim fico me perguntando se cada acréscimo não é na verdade pura imaginação. Na duvida só me resta escrever a respeito.

A primeira coisa de que me lembro e que eu entrava na sala por uma grande porta de madeira, ao entrar vi o velho ao telefone, telefone esse que quando eu cheguei perto da mesa percebi que não existia. As coisas naquele lugar eram tão estranhas mas eu parecia não me importar. Nem eu nem ninguém mais.

Depois de tossir um pouco o velho disse. Bom dia meu filho. Quer café? Não, obrigado. Tudo bem então. Você faz alguma idéia do motivo pelo qual eu mandei te trazer até aqui? Não senhor. Eu não faço a mínima idéia sequer de onde estou. Nesse momento ele deu uma risadinha do tipo “Ora essa.” Rapaz, eu lhe chamei aqui para lhe dizer algumas coisas que acho que você deve ouvir. Tomei conhecimento da sua proximidade com algumas pessoas e de algumas de suas habilidades e façanhas. Você não é nada demais. Já vi mais de quinhentos como você ao longo da minha vida e me pergunte onde eles estão agora. Todos acabados! Eu não entendi o que ele queria dizer com “como você”, mas mesmo assim ignorei esse fato. Rapaz. Você tem que entender uma coisa, uma única e simples coisa que faz toda a diferença no mundo em que você vive. A grande maioria, para não dizer todas as pessoas, não quer nem saber o que você acha, o que você sente, o que você vive ou o que qualquer outro que não seja eles mesmos faz. Você meu jovem está sozinho e assim vai estar pro resto de sua vida. Mas senhor, eu tenho muitas pessoas junto de mim que me apóiam e orientam, pessoas que se importam comigo e com as quais eu me importo, e tenho convicção de que elas estarão comigo pro resto da minha vida. Que belo discurso! Você é bem mais cru do que eu imaginava menino. Não sei se me fiz claro, mas na duvida vou esclarecer isso pra você. Quem são essas pessoas? Não! Não me responda ainda. Elas são importantes? Elas são ouvidas pelas outras? Elas tem poder sobre as demais? Elas não são ninguém! Assim como você elas não são ninguém e não importa por quanto tempo ou quanto vocês tentem, vocês serão sempre ninguém! Nada, zero, lixo, porra nenhuma! Entende?! Admito que enquanto ele socava a mesa entre algumas de suas palavras eu pude ver que no fundo ele afirmava tudo aquilo com um certo pesar. O velho se recompôs, sentou de novo em sua cadeira e acendeu outro charuto. Eu não sabia o que dizer e pra ser sincero acho mesmo que não deveria ter dito nada. Alguns segundos se passaram e ele retomou a conversa. Eu estou aqui para lhe fazer uma proposta. Mas me parece que você ainda não esta apto a compreender o que essa proposta realmente implica. Vou permitir que você pense a respeito e tente encontrar em você o sentido de minhas palavras. Nem sempre podemos vencer menino. Nem sempre podemos salvar o mundo. Sei que você tem passado por muitas coisas ultimamente, mas saiba que esse é só o começo. Só o começo.

Isso é tudo de que me lembro. O que eu não entendo é que não consigo encaixar esse acontecimento cronologicamente em minha vida. De um dia para o outro surgiram essas lembranças como se desencadeadas por algum tipo de código ou chave oculta com a qual posso ter estado em contato recentemente. Tudo o que sei é que ainda vou encontrar aquele velho de novo, mais cedo ou mais tarde.

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